quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

Caminhos do Tejo | Lisboa a Santarém 90 Km



“ O País interior é também, por sua vez, um mito persistente no nosso imaginário. Adiamos sempre percorre-lo, mas saber que ele existe enche-nos de satisfação”
In “ Caminho de Fátima” edição Selecções Reader’s Digest e Centro Nacional de Cultura, ano 2000

Este relato já é de 2012, mas como as vezes o tempo é pouco... algumas coisas ficam por fazer.
Pois bem a ideia de fazer uma caminhada em autonomia já vem de algum tempo, a nossa ideia inicial era fazer o Caminho de Santiago, mas por questões logísticas (tempo) resolvemos fazer o Caminho do Tejo. Só tínhamos 4 dias para o concretizar e iriamos até onde o tempo permitisse… dado o mote toca a fazer a preparação, organizar a mochila, e preparar o itinerário…




A Mochila, após algumas leituras e alguma experiência, o melhor é não levar muita coisa, apenas mesmo o essencial.
-Mochila de 30lt,
- Muda de roupa ( 1 par de calças extras, polar)
- Roupa interior para mudar (meias, cuecas, T-shirt’s etc.. em numero para os dias da caminhada, 2 ou 3 dias)
- Casaco e calças Impermeáveis, 
- Kit primeiros socorros,
- Canivete,
- Cantil,
- kit de emergência ( com vários itens dentro ),
- Chinelos,
- Prato e talheres,
- Carregadores de gadget’s (telemóvel, Pda, camara fotográfica, etc…)
- Saco Cama,
- Lanterna,
- Bastões de Caminhada,
- Polainas,
- Chapéu,
-Toalha,
- Toalhitas e papel higiénico,
- Alguma comida ( barritas de cereais, ou outras, fruta, chocolate, etc…
- Repelente de insectos (que nesta caminhada não foi e fez muita falta),
- Protector solar,
- Pequena bolsa de cintura para ter alguns itens à mão ( documentos, telemóvel, camara Fotográfica, etc…)
E claro umas boas botas…





Um pouco sobre o Caminho do Tejo, é um troço que está em parte sobreposto ao Caminho de Santiago português de quem vem de sul. Está dividido em troços mais ou menos fáceis (dependendo da resistência de cada um, vontade e tempo…). A ideia é chegar a Fátima por caminhos menos utilizados e com algum interesse faunístico, paisagístico e cultural e partir à descoberta.

Saimos de casa às 08h55 a ideia era ter saído as 07h00, mas não estava destinado (Tudo o que pode correr mal... e corre!
Bill vomitou: 10 min. a limpar
Cantil  entornou: +10 min. a limpar
Esquecemos de regar as plantas! +10 min...
Onde puz o passe? 15 min. à procura
Esqueci-me do GPS na entrada!! +20 min. p voltar a casa...
E assim se parte com 1h de atraso...)



De metro até à Expo, e lá encontramos o ponto inicial (em Lisboa) dos caminhos do Tejo e de Santiago.
Percorremos a Expo (tantas aves do Sapal para ver! Especialmente os alfaiates que por ali andam a costurar as margens...), o parque do Trancão e continuamos pela margem direita desse rio até ao Convento das Carmelitas, onde atravessamos para o outro lado e continuamos a segui-lo, agora por terrenos alagadiços e juncais. O caminho é uma estrada de lama a perder de vista, com poças de lado a lado, pelo que avançamos lentamente, num constante tem-te não caias. Conselho: uso de botas impermeáveis, polainas e bastões. Atenção: nesta altura, e apesar da chuva, há muitos mosquitos. No verão deve ser bem pior!!
Encontramos um cágado bebé, que colocamos a salvo na lateral do caminho; avistamos garças e algumas rapinas; cruzamo-nos com um pequeno rebanho que muda de curso, pouco habituado à presença de estranhos. Tudo isto contrasta com o barulho ensurdecedor da auto-estrada em pano de fundo.
O caminho passa por várias quintas dos séc. XVII e XVIII, invariavelmente em ruínas. Mais à frente, zona de recreio de viaturas TT; e duas salamandras esborrachadas... O difícil confronto entre o homem e os seus conterrâneos, que tantas vezes faz por ignorar.
A estirada previa 31km de comprimento até Vila França de Xira, mas talvez devido ao peso e à lama do caminho decidimos pernoitar aos 24km, em Alverca do Ribatejo.







Rescaldo final do dia: algumas bolhas e ombros doridos, mas a satisfação de um percurso lindíssimo e o conforto de habitar o corpo com o cansaço da viagem... Os dissabores acessórios da vida da cidade começam a desfazer-se diante desta experiência de comunhão plena com o corpo e o mundo. Como recompensa, um belo repasto no Restaurante A Lanterna, onde por apenas 7,5€ comemos sopa (de nabiças, deliciosa!), prato, sobremesa, pão e azeitonas, bebida e café. Claro que metade das doses veio connosco, para rechear as buchas do dia seguinte.








Dia 02
A alvorada foi às 7h30 (embora a Sara não dormisse desde as 3h30), pequeno almoço delicioso a poucos metros de caminho, com pão acabadinho de sair do forno e histórias de outros viajantes e peregrinos que por aqui costumam passar. O percurso do dia foi mais decepcionante, quase sempre por alcatrão, havendo a realçar apenas a zona ribeirinha entre Alhandra e Vila Franca.



As bolhas nos pés obrigam a paragem forçada a meio da manhã para reacondicionar dedos e mazelas.
Sempre entre armazéns e zonas fabris, com a linha de caminhos de ferro ao lado, fomos tentando reparar nos poucos retalhos de natureza presentes, como o sapal de aspecto estéril onde ao longe caçavam dois homens, ou as valas ladeadas por caniços onde ainda assim avistamos uma galinha de água e um lindissimo guarda-rios que nos acompanhou furtivamente ao longo de um breve troço!




Na paragem de almoço nova vistoria aos pés, que já se vêm queixando há algum tempo... e descobrimos um osso completamente espetado e fora de sítio no pé da Cláudia! A partir daqui a marcha torna-se cada vez mais dolorosa para ela, e somos de novo forçadas a pernoitar antes do previsto, desta vez na Vala do Carregado, tendo completado apenas 21km. Para o final de etapa previsto, Azambuja, faltavam ainda 11km.
Mais uma vez temos sorte com o alojamento, o banho é escaldante, e o jantar - num restaurante/tasca de beira de estrada - delicioso: sopa da pedra para a Sara, com tudo o que se possa imaginar; bitoque "de orelhas" a sair do prato para a Cláudia, com umas batatas fritas deliciosas e mais tudo a que se tem direito. Sobremesa, chá, e estamos prontas para mais uma noite revigorante (esperando que desta feita durmamos as duas até de manhã!).
Nota: a contagem de quilómetros do guia que estamos a seguir está certamente errada. Pelo que ali se lê, deveríamos estar a 4km de Azambuja, e não a 11km... Notámos discrepâncias na distância de Alverca a Vila Franca, e depois de novo no troço seguinte... A verificar no Basecamp, quando chegarmos a casa.







Dia 3
Saímos da Vala do Carregado de novo pelas 8h30, já com pequeno-almoço tomado e dois bolos para a viagem. O percurso até Vila Nova da Rainha foi interessante, entre campos cultivados, caniços e lamaçais que exigiram mais uma vez o uso de bastões para evitar as proverbiais quedas...



Em Vila Nova da Rainha passamos sobre os rios Ota e Alenquer, que correm lado a lado, separados apenas por um muro de uns 30cm de largo... Intrigante encontro de águas!
A partir daqui, o caminho decorre desagradavelmente pela Estrada Nacional até à Azambuja, onde fizemos uma paragem mais longa do que o habitual para almoçar com amigos que ali vieram ter conosco.
O troço da tarde revela-se delicioso: com início junto à Vala da Azambuja, segue sempre junto à água, seja da Vala ou dos seus braços de rega, e exibe salgueiros e outras árvores de grande porte bordeando os campos cultivados ou acabados de colher. Vemos pescadores a pescar nas valas de rega, uma cobra pequenina a descansar ao sol e um sem-número de pássaros, entre os quais um casal de corujas que caçavam ao entardecer.


Aldeia Palustre... A visitar da próxima vez!!
Terminamos o passeio em Valada, vilarejo pitoresco aninhado atrás do Dique do Tejo mas com bancos de jardim acompanhando toda a sua margem, convidando à contemplação das largas águas.
Desta feita não encontramos alojamento pago e acabamos por ficar no Salão Paroquial...




Dia 04


Alvorada cedo depois de uma noite bem dormida atendendo às condições (dormimos em sofás e com cobertores emprestados que fizeram o "milagre" de nos conservar quentes toda a noite!). Pequeno-almoço num cafezinho que abre às 7h30, o fiambre da sandes é trazido para os cães abrigados (como nós!) no Centro Paroquial, e partimos rumo a Santarém.
O caminho decorre quase todo ao lado do Tejo... Teria sido agradável fazê-lo sobre a Vala, mas devido à falta de manutenção do percurso o matagal que ali grassa tornou infrutíferas todas as nossas tentativas.
Encontramos uma fantástica carrinha de venda ambulante com tudo o que se possa imaginar, compramos uvas, bananas e maçãs para o caminho. As bolhas e outras lesões vão-se fazendo sentir agora com maior intensidade... mas a experiência suplanta estes mesquinhos sofrimentos.
Pelas 14h30 chegamos a Ónias e iniciamos a penosa subida, por asfalto, até à cidade de Santarém. Um atalho pelos campos deixa-nos a vontade de procurar caminho mais agradável... projecto a abraçar num regresso próximo!
Já na cidade, depois de elegido o meio de regresso a casa (o comboio) lançamo-nos numa louca perseguição ao GPS perdido que inadvertidamente ficara num banco de jardim por estar escondido debaixo do chapéu da Cláudia! Felizmente, encontramo-lo no mesmo sítio... com toda a nossa aventura guardada sã e salva!
Uma aventura que repetiremos sem dúvida para completar e, talvez, melhorar...










O nosso percurso final...



Boas caminhadas....

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